EXAME DE CONSCIÊNCIA NO ESPÍRITO SANTO
O grande dom da Páscoa é o perdão dos pecados. Ao
aparecer aos discípulos após a ressurreição, enviando o Espírito Santo, Jesus
oferece como primeiro fruto o perdão: “Recebei o Espírito Santo. A quem
perdoardes, os pecados serão perdoados” (cf. Jo 20, 22-23). Assim, nossa
ressurreição pessoal é o fruto mais belo do perdão dos pecados que reata nossa
amizade com Deus e recupera nossa beleza original.
Para pedirmos a remissão dos pecados necessitamos
examinar nossa consciência, termos conhecimento de nossa vida em Deus. Desse
modo, veremos o quanto nos falta da semelhança divina. É pelo Espírito Santo
que somos capazes de um verdadeiro exame de consciência, exame de vida; e não
de tarefas. O Espírito sonda tudo, mesmo as profundezas de Deus. Ninguém
conhece o que é de Deus, a não ser o Espírito de Deus, que recebemos para
conhecermos os dons que Deus nos concedeu (cf. 1Cor 10-12) e, com ele,
clamarmos o socorro divino.
O Espírito, porém, nos revela a verdade sobre
nossa vida não para nos humilhar ou proclamar nossa inutilidade. Não! Jesus
afirma que ele é o Paráclito, o Advogado (cf. Jo 14,26); e por isso, nos
assiste em nossa fraqueza (cf. Rom 8,26). Ora, se o demônio é o acusador; o
Espírito é o Advogado e Consolador: sonda nossas profundezas para nos dizer:
“vocês podem ser diferentes, Deus lhes oferece a verdadeira vida, não essa que
afasta de uma mais perfeita humanidade”.
O Espírito indica-nos que vivemos na confusão de
Babel (cf. Gn 11, 1-9), onde há apenas competição; e orienta nosso ser para a
unidade (cf. At 2, 1-11), onde todos se compreendem e se reconhecem como
irmãos.
O exame de consciência, feito no Espírito, poderia
nos tirar a coragem de continuar, dado o conhecimento profundo que temos de
nossas misérias, de nossa incapacidade para a reconciliação com Deus e o
próximo. Nesse momento de dúvida, o Consolador vem em socorro de nossa
fraqueza. Intercede em nosso favor, com gemidos inefáveis. Pois, é segundo Deus
que o Espírito intercede em favor dos santos (cf. Rom 8,26-27): a ação de Deus
é fruto da infinita compaixão do Pai pelo Filho, por isso, a intercessão
espiritual é obra da grande compaixão do Senhor.
Certa visão moralizante reduz a vida espiritual ao
comportamento ético, simplifica a vida espiritual no comportamento religioso e,
como fruto, pensamos que examinar a consciência é considerar a observância
maior ou menor dos Dez Mandamentos. E com isso, nos esquecemos que o Decálogo é
a síntese da antiga Lei, sendo as Bem-aventuranças a Lei da Nova Aliança. O
“não” dos mandamentos é amadurecido no “bem-aventurados”: a fidelidade a Deus
deixa de ser privação para se tornar procura incessante da felicidade. Assim, os
Santos são chamados de beatos/bem-aventurados/felizes.
Deficiente formação espiritual oferece para guia
dos fiéis listas de pecados, dividindo-os em veniais, graves e mortais, divisão
essa colocada em cada fase da vida, com numerosas variantes. Tipificar pecados
é o mesmo que dizer que podemos ofender a Deus “de leve”, “seriamente”,
“mortalmente”. Evidente que essa linguagem não leva em conta a seriedade do
amor que se manifesta na atitude de vida e não nos fragmentos do comportamento.
O Espírito Santo nos conduz ao verdadeiro exame de
consciência: coloca-nos diante da pessoa e da vida de Jesus Cristo. E nele, a
palavra central é a palavra que rege o amor: fidelidade. Penetrando as nossas
profundezas, o Espírito Santo revela o quanto de nossas atitudes é vida de
Cristo, vida divina. Nisso o fato da Encarnação é um fato primordial: sem ela,
tudo passa a ser vã pretensão, remendo de leis e remorsos. Deus Filho, assumindo
a carne humana, convida o homem e a mulher a se transformarem na face humana de
Deus.
O fruto da Encarnação não pode ser fragmentado: é
o homem total buscando ser totalmente Cristo no Espírito. Do mesmo modo como
Deus tem o impulso de vir ao nosso encontro, colocou em cada um de nós o
impulso de ir ao encontro dele, impulso que o homem tem no coração e que atinge
o cume no Cristo. O homem e Deus se olham como num espelho e, em certo sentido,
se conhecem (P. Evdokimov) e também percebem o que os diferencia. E Deus faz o
convite a que busquemos a imagem e semelhança de seu Filho.
O Salvador busca destruir tudo o que vem da
natureza decaída e que afasta de Deus, e o faz codividindo a condição humana em
tudo, menos no pecado. Ele nos salva dos três motivos que provocam o
afastamento de Deus: a natureza enfraquecida pela queda original (Cristo a
restaura pela encarnação); o pecado (Cristo o vence pela obediência da cruz); e
a morte (que Cristo vence pela ressurreição). É o que nos revela o Evangelho da
Salvação, é o que conhecemos em nossa vida pela ação do Espírito Santo. Assim,
o nosso exame de consciência nos transporta à felicidade da reconciliação com
Deus Pai.
Pe. José Artulino Besen
Paz e Bem!
Nenhum comentário:
Postar um comentário