O DISCERNIMENTO
DOS ESPÍRITOS... (1Cor 12,10)
Discernimento é aquilo que enxergamos com
os olhos da alma, ou seja, é aquilo que percebemos pelo entendimento da fé; é
um dom do Espírito Santo, trata-se de ver claramente se as situações, as
atitudes, o modo de ser, são ou não conforme a vontade de Deus para a nossa
vida. Por meio desse dom, percebemos quem está falando ou atuando; ou se os
acontecimentos são dos homens; são de Deus, ou se é algo que vem do maligno. De
uma coisa fiquemos certos, estas realidades não se misturam nunca (cf. Is
55,7-11; Jo 14,30), e é este o critério para que tenhamos um verdadeiro
discernimento.
Aquilo que é do homem pode mudar pelo
arrependimento (cf. Lc 15,7), ou por sua inconstância (cf. Tg 1,5), ou ainda por
sua ignorância (cf. Lc 12,47); aquilo que é de Deus é definitivo, como bem nos
ensinou São Tiago: “Toda dádiva boa e
todo dom perfeito vêm de cima: descem do Pai das luzes, no qual não há mudança,
nem mesmo aparência de instabilidade.” (Tg 1,17). Enquanto que, aquilo que
é do maligno é sempre mau e uma grande mentira (cf. Jo 8,44). Assim,
compreendemos que é Deus quem protege a humanidade; a humanidade por sua vez
procure fazer a vontade de Deus, pois é somente ela que dá sentido a nossa vida;
e a vontade de Deus se faz presente em seus mandamentos e nas palavras e ações de
seu Filho, Jesus Cristo. Por outro lado, as únicas armas de que o inimigo dispõe
são as tentações; e estas podem ser combatidas por uma vida de santidade obtida
nos Sacramentos, e pelas penitências e orações, e a intercessão dos santos, com
as quais buscamos as graças de Deus para seguirmos cumprindo seu plano de amor
para a nossa salvação eterna.
Com efeito, eis o que o Senhor Jesus nos
ensinou para obtermos um bom discernimento: “Ouvistes ainda o que foi dito aos antigos: Não jurarás falso, mas
cumprirás para com o Senhor os teus juramentos. Eu, porém, vos digo: não jureis
de modo algum, nem pelo céu, porque é o trono de Deus; nem pela terra, porque é
o escabelo de seus pés; nem por Jerusalém, porque é a cidade do grande Rei. Nem
jurarás pela tua cabeça, porque não podes fazer um cabelo tornar-se branco ou
negro. Dizei somente: Sim, se é sim; não, se é não. Tudo o que passa além disto
vem do Maligno.” (Mt 5,33-37). Ou seja, somos filhos da verdade e somente a
verdade pode sair de nosso coração, porque a verdade liberta e salva sempre
(cf. Jo 8,32).
Então, o que é o discernimento dos espíritos?
Trata-se dos pensamentos consentidos e externados em atitudes e ações,
realizadas por nós mesmos ou pelos outros, pois tudo o que é pensamento nosso
ou dos outros vem de fonte invisível, como o próprio pensamento que é invisível
em si mesmo; porém, depois de externados e examinados, é que são discernidos; Jesus,
porém, os discernia perfeitamente antes de externados e examinados, por ser o
Filho de Deus, e conhecedor de todas as coisas (cf. Col 1,15-17). Convém aqui
lembrar que, antes de tudo, esteja o nosso coração pleno do primeiro e o segundo
mandamentos, ou seja, o mandamento do “amor
a Deus acima de todas as coisas; e ao próximo como a si mesmo”. Pois, é fundamentados
no amor, que devemos agir sempre; e assim acolhermos ou rejeitarmos aquilo que
concorda ou discorda desse amor (cf. 1Jo 4,8.16).
De fato, vivendo num mundo de tantas
contradições e de tantos credos religiosos, precisamos está atentos na vivência
de nossa fé, para não cairmos nas contradições e armadilhas do mal, que usa de
todos os meios e tentações, para nos afastar da comunhão com Cristo e da Sua
Santa Igreja, pois, como disse São Paulo: “Jesus é a Cabeça do Corpo, da Igreja”
(Col 1,18), do qual somos os seus membros. Logo, o discernimento nos é necessário
para nos atermos seguros daquilo que diz respeito à nossa salvação eterna; e
nada melhor para esse discernimento que o amor, a obediência, a fidelidade, a
humildade, e a perseverança como membros do Corpo de Cristo que somos. Para
isto ele derramou em nossas almas, pelo batismo, o Espírito Santo com todos os
seus dons e frutos para nos aperfeiçoar em nossa condição de redimidos.
Realmente, quando tratamos da Igreja,
Sacramento Universal da Salvação; da vivência e prática da fé e dos bons costumes;
das mais diversas vocações no seio da Igreja; da participação nas instituições que
compõem a nossa sociedade; precisamos ter a certeza do discernimento que nos é
dado pelo Senhor, por meio da Sagrada Escritura, da Tradição e do Magistério da
Igreja, como Ele nos ensinou: “Quem vos
ouve, a mim ouve; quem vos rejeita, a mim rejeita; e quem me rejeita, rejeita
aquele que me enviou” (Lc 10,16). E que também São Paulo nos confirma: “Toma por modelo os ensinamentos salutares que
recebestes de mim sobre a fé e o amor a Jesus Cristo. Guarda o precioso depósito,
pela virtude do Espírito Santo que habita em nós”. (2Tim 1,13-14).
Quanto ao discernimento pessoal, as bases são
as mesmas: a instituição e os valores a que estamos ligados (Sagrada Escritura,
Tradição, Magistério da Igreja; fé, mandamentos, virtudes, Sacramentos, vida de
oração, obras de misericórdia, etc.). Desse modo, como a fonte é cristalina, a
água também é cristalina; caso contrário, não discerniríamos nada. É como disse
o Senhor Jesus: “Ou dizeis que a árvore é
boa e seu fruto bom, ou dizeis que é má e seu fruto, mau; porque é pelo fruto
que se conhece a árvore.” (Mt 12,33). Aqui se trata das graças recebidas da
fonte inesgotável do amor de Cristo pelos membros do seu Corpo, a Igreja. Pois,
“Cristo amou a Igreja e se entregou por
ela, para santificá-la, purificando-a pela água do batismo com a palavra, para
apresentá-la a si mesmo toda gloriosa, sem mácula, sem ruga, sem qualquer outro
defeito semelhante, mas santa e irrepreensível.” (Ef 5,25b-27).
Destarte, para termos um discernimento
perfeito, conforme a vontade do Senhor, eis algumas passagens bíblicas que nos
dão as precisas instruções para isto: “Guarda
teu coração acima de todas as outras coisas, porque dele brotam todas as fontes
da vida.” “O coração é, na Bíblia, considerado como sede da inteligência, dos
desejos, dos pensamentos, da vontade, da consciência.” (Pr 4,23 e nota). E
ainda: “Eu vos exorto, pois, irmãos,
pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos em sacrifício vivo,
santo, agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual. Não vos conformeis
com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso espírito, para que
possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o que lhe agrada e o
que é perfeito.” (Rm 12,1-2).
Por fim, escutemos o Senhor: “Vigiai e orai para que não entreis em
tentação. O espírito está pronto, mas a carne é fraca”. (Mt 26,41). “O espírito é que vivifica, a carne de nada
serve. As palavras que vos tenho dito são espírito e vida”. (Jo 6,63). “Portanto, irmãos, não somos devedores da
carne, para que vivamos segundo a carne. De fato, se viverdes segundo a carne,
haveis de morrer; mas, se pelo Espírito mortificardes as obras da carne,
vivereis, pois todos os que são conduzidos pelo Espírito de Deus são filhos de
Deus”. (Rm 8,12-14)
Paz e Bem!
Frei Fernando Maria,OFMConv.
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